Encontro presencial entre Lula e Trump na cúpula da ASEAN é tratado como possibilidade concreta após telefonema de 30 minutos que ambos classificam como positivo.
Foto: Jim WATSON / AFP | reprodução do Brasil de Fato

Marco Rubio, secretário de Estado dos Estados Unidos
Da Redação da Rede Hoje
A conversa, que se estendeu por aproximadamente meia hora, foi descrita por membros do Planalto como produtiva e surpreendentemente cordial. O clima representa uma guinada após um período de relações congeladas e retórica agressiva de ambos os lados. O diálogo focou predominantemente na questão comercial e nas barreiras impostas.
Alckmin reiterou que o presidente Lula enfatizou a disposição brasileira para negociar e encontrar soluções mútuas. No entanto, o líder brasileiro não evitou os temas espinhosos que tensionam a relação bilateral. A pauta incluiu claras cobranças por parte do governo nacional.
O presidente Lula solicitou a revogação das sanções aplicadas a autoridades do país, citando nominalmente o ministro Alexandre de Moraes. A inclusão de nomes brasileiros na lista da Lei Magnitsky dos EUA é vista pelo Itamaraty como uma interferência inaceitável na soberania nacional.
A expectativa imediata é que os canais abertos por Rubio e sua contraparte brasileira possam estabelecer uma agenda de trabalho concreta. Ainda não há data marcada para a primeira reunião de negociação, mas o fluxo de comunicação foi restabelecido em alto nível.
Tom amistoso e agenda compartilhada
A avaliação positiva do telefonema foi um raro ponto de concordância entre Brasília e Washington. Enquanto o Planalto falou em "tom amistoso", o próprio Donald Trump usou suas redes sociais para classificar o diálogo. O presidente americano escreveu que a ligação foi "muito boa" e que gostou da interação com seu homólogo.
Trump também confirmou publicamente a intenção de realizar um encontro presencial com Lula em um "futuro não muito distante". Em sua característica forma de comunicação, ele sugeriu que a reunião poderia ocorrer "tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos". A declaração amplifica o sinal de aproximação dado pela indicação de Rubio.
Do lado brasileiro, participaram da videoconferência, além do vice-presidente, os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Mauro Vieira (Relações Exteriores). A presença do chanceler reforça o caráter estritamente diplomático e de Estado do contato, evitando leituras partidárias. A estratégia foi minimizar ruídos e focar na agenda prática.
O ministro Haddad, em declarações separadas, classificou o resultado da conversa como "positivo" do ponto de vista econômico. Para a equipe econômica, a reabertura do diálogo é crucial para destravar um comércio bilateral que movimenta dezenas de bilhões de dólares anualmente. O setor privado aguarda ansioso por sinais de normalização.

O caminho até a mesa de negociações
O telefonema desta segunda-feira não foi um evento isolado, mas sim uma etapa preparatória combinada previamente. A semente foi plantada duas semanas antes, durante um breve cruzamento nos bastidores da Assembleia Geral da ONU, em Nova York. Na ocasião, ambos mencionaram publicamente uma "boa química" pessoal.
Foi o próprio Trump, em seu discurso no plenário da ONU, que anunciou ao mundo o breve encontro casual e a intenção de aprofundar o contato. A revelação pegou muitos observadores de surpresa, dada a histórica hostilidade verbal do republicano contra o líder petista. O gesto foi imediatamente lido como uma mudança tática.
Agora, a diplomacia brasileira trabalha com a possibilidade real de um encontro face a face ainda em outubro. A cúpula da ASEAN, que ocorrerá na Malásia, surge como o palco mais provável para esse primeiro aperto de mãos formal. A reunião em terreno neutro é considerada a opção mais segura e diplomaticamente elegante.
Fontes do governo, citadas pelo jornal O Globo, avaliam que o contato virtual inicial foi uma jogada estratégica. A modalidade permitiu ao Planalto medir o clima e a disposição real de Trump sem os riscos e custos políticos de uma viagem fracassada. O resultado, consideram, validou a abordagem cautelosa.
Repercussão política e desconforto interno
A súbita aproximação entre Lula e Trump gerou ondas de choque imediatas no espectro político brasileiro, em especial entre os aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro. Para essa base, a imagem de Trump dialogando cordialmente com Lula é um duro golpe simbólico e estratégico. A reação foi de visible desconforto.
Há uma preocupação concreta no campo bolsonarista sobre o enfraquecimento de seus principais interlocutores com o círculo republicano nos EUA. O deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e o comentarista Paulo Figueiredo viram sua influência ser publicamente contornada pelo gesto direto de Trump. Um político do PL admitiu o revés.
O episódio é visto pelo Planalto como mais do que uma vitória diplomática; é uma demonstração de força interna. Em agosto, uma reunião do ministro Haddad com autoridades americanas foi cancelada após pressão de setores da extrema-direita brasileira. Desta vez, o bloqueio não se repetiu, indicando limites dessa influência.
Para o governo, a conversa bem-sucedida serve como um termômetro do real alcance da militância bolsonarista sobre a Casa Branca. A avaliação é que, quando Trump decide engajar-se diretamente em um tema de interesse nacional americano, as vozes externas perdem força. O momento é de cautelosa comemoração em Brasília.

Os próximos passos e a complexa pauta
A designação de Marco Rubio coloca um interlocutor de alto nível e confiança de Trump no centro da discussão. Cabe a ele e ao chanceler Mauro Vieira destrinchar a complexa pauta que inclui, mas não se limita, ao tarifaço. O imposto de até 50% sobre exportações brasileiras é a questão mais urgente para o Brasil.
Por outro lado, a administração Trump mantém em seu radar a atuação do Judiciário brasileiro, especialmente do Supremo Tribunal Federal. As sanções ao ministro Alexandre de Moraes, sob a Lei Magnitsky, são um ponto de grande atrito e que Lula exigiu ver revogado. É uma barreira política considerável a ser transposta.
A nota oficial do governo brasileiro, divulgada após a ligação, fez questão de destacar um detalhe protocolares significativo. Foi Trump quem ligou para Lula, e não o contrário. Para a diplomacia, esse nuance sinaliza que a iniciativa e o interesse em recompor a relação partiram do lado americano.
O Itamaraty também ressaltou, em sua comunicação, que o Brasil é um dos únicos países do G20 com quem os EUA mantêm superávit comercial. O argumento econômico é uma das principais cartas na manga da negociação brasileira, usada para demonstrar que a relação é benéfica e equilibrada para ambas as partes.
Enquanto as equipes técnicas se preparam para as difíceis negociações que se avizinham, a perspectiva de um aperto de mãos entre Lula e Trump na Malásia ganha força. O sucesso ou fracasso desse primeiro encontro presencial deve ditar o tom de uma relação bilateral que tenta sair de seu pior momento.
Com informações do ICL Notícias, O Globo e Agência Brasil