O que é 'vencer na vida'? Há os que tiveram sucesso 'vencendo' os outros, derrubando concorrentes, impondo-se pela força e pelo dinheiro. E há os que tiveram sucesso ajudando os outros, colaborando, contribuindo para a sociedade. Paulo Freire, Josué de Castro, Celso Furtado e tantos outros. Na corrida pelo sucesso, temos de pensar para onde estamos correndo, e o que realmente vale a pena
Por Ladislau Dowbor
“A maldade desta gente é uma arte”
(Ataúlfo Alves)
Temos o dinheiro, temos a tecnologia, temos estatísticas detalhadas sobre cada drama, em cada canto da terra. Temos até instruções passo a passo nos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU para 2030. Mesmo assim, apenas olhamos e balançamos a cabeça. Nossos problemas não são econômicos, são uma questão de organização social e política. É uma questão de mudança cultural. Sentimo-nos institucionalmente desamparados. E a ética tem muito a ver com os desafios.
Todos temos direito a um pouco de filosofia, ainda que hoje para tudo se exija diploma. Mas somos filósofos na intimidade. É uma questão de sobrevivência. A partir de certa idade, você não pode deixar de se questionar: qual é o sentido de tudo isso? Para onde estamos todos correndo? Wim Wenders teve esse momento de lucidez: “Humanity is craving for meaning”. Dar sentido à vida.
Venderam-nos a ideia de que precisamos entrar na corrida pelo sucesso. Saia na frente dos outros, esse é o objetivo geral. Mas à frente dos outros para quê? Ao cruzar com um professor esbaforido no corredor da PUC-SP, outro dia, não pude deixar de questioná-lo: para onde estamos correndo? Ele sorriu, e encolheu os ombros: quem sabe? Nós apenas corremos. Corra, cara, corra. Um filme que assisti em 1962, The Loneliness of the Long Distance Runner, está muito presente para mim hoje, passados mais de cinquenta anos. O herói do filme, interpretado por Tom Courtenay, decide que ficar à frente de todos não é o seu negócio.
Bem, se você correr mais rápido, deixará os outros para trás, você está na frente, você é um sucesso. Você terá uma coroa de louros, um mausoléu, ou construirão um enorme obelisco em sua homenagem, na Place de la Concorde ou em qualquer lugar surgirá um enorme monumento, mais alto que os outros. No Rio de Janeiro também temos um obelisco na parte central da cidade. Quem se lembra em honra de quem? O importante é que fique bem visível.
Décadas atrás, com o HIV em todos os lugares, havia uma luta para que fossem autorizadas campanhas publicitárias pelo uso de preservativos, contra todos os protestos chocados dos conservadores de sempre. Carlos Minc, então secretário do Meio Ambiente no Rio, teve uma ótima ideia: pediu para o pessoal de escola de samba costurar uma gigantesca camisinha, e em plena luz do dia, um helicóptero alugado foi baixando a camisinha sobre o obelisco no centro da cidade. Não há mídia que resista à visão da gloriosa ereção recebendo o preservativo, sensibilizando milhões de brasileiros para o não menos gigantesco problema da Aids no Brasil. Ninguém mais achava absurdo discutir Aids e preservativo. Com que rapidez o sentido do sucesso pode mudar: contribuir para uma coisa útil.
Frans de Waal, em seus estudos apurados sobre Our Inner Ape (O primata dentro de nós) comenta uma notícia de jornal norte-americano, sobre uma mulher presa por amamentar um bebê em um supermercado. Como os americanos podem ficar tão chocados ao ver um seio, pergunta de Waal, quando você pode vê-los aos pares em qualquer praia da Europa? Os americanos consideram armas algo natural, mas a visão de um seio assussta, rompe com as normas sociais. É tudo uma questão de normas sociais, muitas vezes ridículas ou divertidas, mas é mais importante nos preocuparmos com direitos humanos.
As normas podem mudar, os humores sociais podem mudar, mesmo que pareçam tão rígidos e até sejam eternos frente ao curto prazo das nossas vidas. A escravidão há pouco mais de um século era considerada algo natural, da mesma forma o colonialismo nos tempos do meu pai e mesmo na minha juventude. O apartheid na África do Sul foi ontem. Na Palestina continua. Conseguimos avançar nesses dramas, mas devemos considerar os novos desafios, que envolvem uma profunda mudança cultural, uma abordagem civilizada e solidária de como nos organizamos como sociedade.
Sabemos tudo sobre as dinâmicas desastrosas que enfrentamos, cabem em um parágrafo. Estamos destruindo a vida neste planeta, embora tenhamos toda a tecnologia necessária para reverter a tendência. Estamos mantendo mais da metade da população mundial na pobreza, em condições humilhantes, embora o que produzimos em todo o mundo seja equivalente a 20 mil reais em bens e serviços por mês por família de quatro pessoas. Bastaria uma moderada redução da desigualdade para assegurar a todos uma vida digna e confortável. Isso vale também para o Brasil, com o equivalente de 11 mil reais. E destruir a Amazônia faz algum sentido?
Os recursos financeiros necessários para consertar tanto o meio ambiente quanto os dramas da desigualdade correm livremente em investimentos especulativos, embora saibamos muito bem o que fazer para torná-los produtivos. No mundo morrem anualmente de fome cerca de 6 milhões de crianças. No Brasil temos 20 milhões de pessoas passando fome, numa país que produz o equivalente a 3,2 quilos de grãos por dia por pessoa. Para os traders que negociam os grãos, é mais rentável o mercado externo. É preciso ser mais claro?
Temos o dinheiro, temos a tecnologia, temos estatísticas detalhadas sobre cada drama, em cada canto da terra. Temos até instruções passo a passo nos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU para 2030. Mesmo assim, apenas olhamos e balançamos a cabeça. Nossos problemas não são econômicos, são uma questão de organização social e política. É uma questão de mudança cultural. Sentimo-nos institucionalmente desamparados. E a ética tem muito a ver com os desafios.
Peter Drucker tinha uma compreensão profunda do desafio quando escreveu, que “não haverá negócios saudáveis %u20B%u20Bem uma sociedade doente”. Podemos levar essa compreensão para a nossa vida cotidiana: não haverá vida digna em um planeta doente. Por quanto tempo o homo sapiens que temos dentro de nós seguirá repetindo o “the business of business is business”, idiotice de Milton Friedman que livrava as corporações da responsabilidade social e ambiental. O sucesso de Friedman se deveu essencialmente ao fato de ele trazer lustro acadêmico àquilo que as corporações querem, que é pegar qualquer coisa, a qualquer custo, sem qualquer regulação e isso parecer legítimo. Vemos nos noticiários de TV homens adultos, pulando como primatas, e entoando Greed is Good (ganância é bom), no fechamento do dia em Wall Street. Não, Greed is not Good. Nós temos que construir um novo normal.
Temos nos alimentado, e certamente fomos alimentados, com uma simplificação cultural: é preciso correr e alcançar “o sucesso”. E sucesso é medido na quantidade de dinheiro que você ganha, mas dinheiro é riqueza individual, não é bem comum. Não é melhoria para a comunidade na qual você se insere e com a qual contribui, tampouco para a construção de um planeta saudável. Tenho na minha mesa a edição brasileira da revista Forbes, apresentando os 315 bilionários que temos no país. Os escolhidos para a capa estão sorrindo: é um sucesso para um bilionário estar na capa da Forbes. Antes de pensar em maldade, precisamos dar uma boa chance à ignorância.
Ter sucesso por meio do acúmulo de riqueza tende a significar que foi “uma conquista”. A implicação é que é “merecida”. Em um livro inspirador, Gar Alperovitz e Lew Daly chamaram a moderna acumulação de riqueza de Apropriação Indébita. É o título do livro inclusive, em que eles mostram que todo o progresso que tivemos resultou basicamente do progresso tecnológico, que em si é resultado de construções sociais, da eletricidade à eletrônica ao DNA, à biologia moderna e à internet. Mariana Mazzucato deu mais força ainda a essa compreensão em seu O Estado Empreendedor, mostrando a dimensão social e generalizada dos avanços.
Joseph Stiglitz mostra que atualmente as fortunas são essencialmente construídas a partir de atividades especulativas, juros, dividendos e organização de monopólios, ao invés do lucro resultante da contribuição produtiva para a sociedade. Marjorie Kelly e Ted Howard chamam isso de extractive capitalism, mostrando que a riqueza extraída é muito maior do que a contribuição produtiva, gerando um resultado líquido de extração. Thomas Piketty enterrou o que restou da aparência de legitimidade do capitalismo, em seu estilo, sob montes de páginas, mas também com um raciocínio muito sólido: a contribuição produtiva para a sociedade e o acúmulo de riqueza tornaram-se rodas separadas. E rodas separadas no veículo econômico não funcionam. Não é apenas ilegítimo, simplesmente não está funcionando. O PIB mundial cresce a um ritmo médio de 2% a 2,5% ao ano, mas a especulação financeira rende cerca de 7% a 9% nas últimas décadas. O dinheiro obviamente tem ido para onde paga mais. O Brasil está se desindustrializando.
A chave para as novas tendências reside na compreensão de como vinha funcionando o progresso econômico e social até algumas décadas atrás, e como está sendo transformado. O principal insumo produtivo, ou fator de produção, hoje é o conhecimento e a tecnologia incorporados aos processos produtivos. A agricultura e o controle da terra eram o principal fator de produção séculos atrás, depois com revolução industrial veio a máquina e a propriedade da fábrica. Hoje, com a revolução digital, é o insumo imaterial, o conhecimento, a informação, o dinheiro virtual e as diversas dimensões da tecnologia, que se tornaram o motor propulsor da economia. Isso muda as regras do jogo, abre novas oportunidades: Se uma pessoa tem uma ideia inovadora, essa ideia pode se espalhar pelo mundo sem nenhum custo adicional. O conhecimento é um bem comum. O dinheiro que está nos bancos é de quem?
Se você produz bicicletas, produzir para mais pessoas envolve custos adicionais. A ideia é diferente. Depois de cobrir os custos de gerá-la, é muito mais produtivo para a sociedade deixar a ideia fluir do que multiplicar patentes e gerar escassez artificial. Em tempos de pandemia, milhões morrem enquanto o Big Pharma mantém suas patentes pré-históricas de 20 anos. A inovação deve certamente ser recompensada, mas na devida proporção dos insumos e no respeito ao fato de que o conhecimento livremente acessível tem um enorme efeito multiplicador. Colocar pedágios sobre o acesso às ideias resulta em fortunas para poucos, enquanto a colaboração gera um progresso generalizado de enriquecimento coletivo. Tim Berners-Lee não patenteou a World-Wide-Web, ele não fez fortuna individualmente, com seu www. Permitiu que bilhões aumentassem sua produtividade pelo mundo afora. Precisamos de inteligência social e ambiental, não apenas da capacidade de superar os outros. Sucesso pela contribuição, mais do que do que truculência e esperteza.
Podemos ver isso de outra maneira. Temos grande número de pesquisas e estudos sobre a felicidade humana. Você pode pensar que ter dinheiro é uma boa medida: não é. Ou melhor, se você é muito pobre, ter algumas centenas de reais a mais acrescenta muito ao seu sentimento de felicidade. Mas depois que você atinge um limite relativamente modesto, da ordem de menos de 100 mil reais por ano, acumular dinheiro continua enquanto ilusão, mas o sentimento de felicidade estagna. Passam a ter mais importância o enriquecimento social e cultural, as relações familiares, é uma variedade de objetivos que tendem a predominar. Um milhão a mais nas mãos de um milionário, isso pode levantar seu obelisco, e vai batalhar por sempre mais, mas não o deixará mais feliz. Os poucos recursos suplementares colocados na base da pirâmide geram não apenas muito mais felicidade, eles reduzem drasticamente o sofrimento. Os mesmos recursos que já temos, mas melhor distribuídos, aumentariam radicalmente a sua produtividade social. Tornar um planeta menos desigual não é apenas uma questão de justiça, é também uma questão de inteligência social e econômica.
Então, do que se trata? Fazer alguns obeliscos a mais e mais altos ou gerar sustentabilidade e bem-estar geral? Lutar contra rivais, derrotar concorrentes, poderia eventualmente fazer algum sentido quando você competia para produzir mais e melhores bens e serviços para a sociedade, mas na era da revolução digital, quando a colaboração é muito mais produtiva do que a competição, o que resta é a obsessão pelo sucesso individual, mostrar mais dinheiro, se mandar para o espaço. “S’envoyer en l’air”, como os franceses chamariam, com um objetivo mais sábio e melhores resultados. Cada um de nós contribuiu com a viagem do Bezos, ao realizarmos compras com a Amazon.
A lição básica é simples: seja qual for o seu sucesso individual, se não for acompanhado do sucesso ou do bem-estar da sociedade como um todo, bem como da restauração do planeta, você é apenas um oportunista. Possivelmente bem-sucedido, mas ainda oportunista. O importante não é correr mais rápido, mas entender para onde estamos indo. Não apenas sendo inteligente em termos dos meios que você usa, mas inteligente em termos de resultado sistêmico.
Sucesso individual não faz sentido se prejudica o bem-estar social.
Quanto ao obelisco, eu teria algumas ideias.
Publicado originalmente no Carta Maior
Costumo dizer que antes de sermos profissionais do esporte, fomos torcedores.
Cada um dos colunistas do Lei em Campo antes de serem advogados, gestores, juristas ou jornalistas, foram torcedores.
Nunca escondi minha paixão pelo Clube Atlético Mineiro. Pelo contrário, sempre ostentei com orgulho o “ser atleticano”.
Meu pai odiava futebol. Minha mãe, muito embora sempre tente esconder, era cruzeirense. Meu irmão é cruzeirense.
Nasci Atleticano, sem dúvidas.
Minhas mais tenras lembranças do Atlético começam aos 6 anos, Copa União. Como chorei naquela derrota pro Flamengo.
Muitas derrotas e muitos “quases” vieram. 1991, 1994, 1999, 2001, 2012, 2020.
Meu primeiro grande título foi a Conmebol de 1992. Depois o bi em 97.
Teve rebaixamento e volta apoteótica com o incontestável título da segunda divisão no ritmo de “Vou festejar”.
A redenção veio com a Libertadores de 2013. Ronaldinho Gaúcho devolveu o Atlético para a prateleira de cima do futebol brasileiro.
Em 2014, a Recopa e a Copa do Brasil contra o então maior rival ratificou a “virada” do Clube.
Mas faltava algo!!
Faltava o Brasileirão que nos foi injustamente tirado em 77 e em 80.
A torcida evitava o tema, mas era uma obsessão.
Veio 2021, perdemos o Brasileiro de 2020 por 3 pontos. O fôlego que faltou foi preenchido com elenco. Chegou o Hulk. Chegou Diego Costa. A massa sonhava.
Perdemos a Libertadores invictos em um lance ridículo e talvez ali começamos a ganhar o Brasileiro.
Foco total. O Atleticano começou a respirar Brasileirão. Ninguém comia ou dormia direito. A obsessão invadiu nossa alma e nosso coração.
A torcida comprou a “bronca”. Foi o décimo segundo, o décimo terceiro e o décimo quarto jogador.
Ir ao Mineirão passou a ser uma obrigação. Batíamos pontos e trabalhávamos pelo Clube.
O Flamengo, de novo, era o fantasma que nos assombrava.
Os cariocas não perdiam…
Veio o jogo com o Bahia. Uma vitória nos daria a glória eterna. 50 anos depois.
Primeiro tempo trouxe um burocrático zero a zero. Começa o segundo tempo. “Pow”. Bahia 2 a zero.
Penalti pro Galo (foram muitos. Óbvio. Com o volume de jogo do time, natural que estivessem mais tempo na área e mais expostos aos penais).
Hulk diminui a diferença.
2 minutos depois, Keno empata.
Lembrei-me da semi da 87. Naquela oportunidade buscamos o empate, mas tomamos o terceiro. Dessa vez tinha que ser diferente.
Mais 3 minutos. Keno de novo, em um lance que lembrou o gol de Eder contra a URSS na Copa de 82, viramos o jogo.
Estiparvamos ali os fantasmas que nos assombraram por 50 anos.
Honramos e vingamos Reinaldo, Cerezo, Eder, Luizinho, Marques, Guilherme, João Leite, Renato, Sérgio Araújo, Paulo Roberto, Eder Lopes e tantos outros…
5 minutos resumiram 50 anos de Atlético.
Nada nunca foi fácil pra gente.
Fomos cunhados na dor, na injustiça, na raça e no amor.
Vencemos o vento, Roberto Drummond, meu patrono na Academia de Letras de Nova-Lima.
Gritamos Galo com a alma, que, sem dúvidas, Mário Marra, é melhor do que gritar é campeão.
Como disse no início, antes de tudo, sou ATLETICANO e seria impossível falar de qualquer outro tema.
Escrevo enquanto as lágrimas brotam nos meus olhos escorrem no meu rosto.
Gustavo Henrique e João Gustavo. A gente é Galo! Vocês são campeões brasileiros!
Crédito imagem: Alexandre Guzanshe/D.A Press
Recordações. De um tempo que se foi. Porém, a atual velha guarda, a denominada terceira idade, vivenciou-as. Para essa turma, fatos de 50 a 70 anos atrás parecem que aconteceram ontem. Um ontem imensurável. Um ontem chamado também de outrora. Alguma coisa muito interessante pode ser destacada. São, então, as recordações de outrora. Como a atuação da Igreja Católica diante dos filmes em exibição, a celebração da Santa Missa, como o Ginásio Dom Lustosa lidava com a religiosidade dos alunos, o luto familiar quando falecia membro da família, o rádio e os costumes na sexta-feira da Paixão, palavras usuais e tantas lembranças que se tornaram indeléveis.
A IGREJA E (ATÉ) FILMES (PROIBIDOS) – Nos anos 50 e 60, havia a cotação legal (cívica), afixada nas entradas, dos dois cinemas da cidade (Cine Patrocínio e Cine Rosário), que era “filme para maiores de 18 anos, ou 14 anos, ou 10 anos ou livre”. Além dessa classificação, tinha a cotação de filmes da Igreja Católica, afixada na entrada principal da Igreja Matriz Nossa Senhora do Patrocínio. Referia-se aos filmes da semana. Essa cotação moral mostrava a rigidez da Igreja com o que ela entendia como sendo moralidade. Os filmes eram denominados assim: condenado (proibido para todos – era pecado assistir ao filme); prejudicial (só para adultos, mas com restrições); filmes para adultos (maiores de 18 anos, hoje, poderiam esses filmes serem comparados com as novelas de 18 horas); filme tolerável (muita restrição), e o filme livre (bichos e de crianças).
EXEMPLOS – “... E Deus Criou a Mulher” com a atriz francesa Brigitte Bardot foi um filme condenado (apenas insinuações e poucas cenas similares às novelas das 19h, hoje). “Marcelino, Pão e Vinho” é um filme livre com o espanhol Pablito Calvo. “Sissi, a Imperatriz” com Romy Schneider, filme infanto-juvenil puro, que foi cotado “para maiores de 14 anos”, pela Igreja.
MISSA – Até 1962/1965, a Santa Missa era celebrada em latim, com o sacerdote voltado para o altar e de costas para os fiéis. Apenas membros do clero participavam da celebração (mulheres não participavam). A comunhão, por exemplo, na Igreja Matriz era distribuída apenas por padres. Os fiéis ajoelhavam-se no murinho em volta do altar para receber a santa hóstia. E preferencialmente as mulheres ficavam do lado direito e os homens do lado esquerdo da Igreja. Também na entrada principal havia o aviso para as mulheres: saia justa e roupa decotada não eram permitidas.
AUSÊNCIA À MISSA: PECADO E NOTA BAIXA – Os alunos do Ginásio Dom Lustosa (só meninos) eram obrigados a irem à missa, às 8h, aos domingos e dias santos. O controle se realizava por meio da caderneta escolar (cada aluno possuía sua caderneta do ano que registrava a presença ou ausência diária às aulas e a missa aos domingos, além das notas em todas as matérias). No domingo, o aluno apresentava a caderneta a um aluno designado pelo diretor (Ademar Nunes, o denominado “Bagunça”, foi um desses alunos) na entrada da Igreja, antes do horário da missa. Durante a celebração, a caderneta era levada à sacristia onde recebia o carimbo “MISSA”. Na segunda-feira, o aluno que não tivesse esse carimbo na sua caderneta teria que apresentar atestado médico ou justificativa maior feita pelos pais, senão era suspenso de aulas ou teria pontos tirados nas provas mensais. Além de tudo isso, os alunos, na primeira sexta-feira de cada mês, eram obrigados a participar de culto religioso em frente a imagem de Cristo, no jardim central da escola, antes de serem iniciadas as aulas.
O LUTO – Quando alguém perdia familiar direto, por falecimento, após a missa de 7º dia, vestia todo de preto, por pelo menos um mês. Há casos de ocorrência anual. Os mais modernos colocavam uma fita preta na camisa ou no vestido.
RESPEITO À PAIXÃO DE CRISTO – Sexta-feira da Semana Santa era o dia para não fazer nada. As emissoras de rádio (a TV ainda engatinhava) apenas tocavam músicas clássicas. A Difusora não operava. A Rádio Nacional do Rio (a TV Globo de hoje), no lugar de suas novelas, apresentava episódios da vida e morte de Jesus durante o dia (como se fosse uma série). Dia de jejum, comer carne nem pensar, nem varrer casa podia. A procissão do Enterro (19h) tinha a participação de quase toda a cidade. Uma multidão com velas nas mãos.
PALAVRAS DE USO COMUM – Vamos comer “pelota”? Pelota é almôndega (carne). Naquele armazém tem “manteiga de leite”. Uai, precisava dizer “de leite”? Sim, pois “banha de porco”, gordura, era também denominada “manteiga”. “Pão sovado” parece que não existe mais. “Bolacha Maria”, “bolacha champanhe”, não seriam hoje biscoitos? Você está namorando aquele “biscate”? “Biscate” era moça fácil, topava tudo, sem ser prostituta. E quem namorava “biscate” era “biscateiro”. Preciso fazer uma “catira” com meu amigo. Explicando, “catira” é troca de mercadorias, troca de bens populares, praticamente se envolver dinheiro. E quem fazia “catira” era “catireiro” (relógio por rádio, botina por chapéu, roupas, etc.). Vicente Caldeira, que “tinha uma venda” (pequenino armazém que vendia pinga e cereais a quilo), à Rua Cassimiro Santos com Rua Bernardino Machado, e, José Mendes (servidor do Fórum), lideravam as “catiras”.
MAIS PALAVRAS HOJE EM DESUSO – “Carapina” é carpinteiro, é marceneiro. No futebol, às vezes o goleiro era denominado “arqueiro”, zagueiro era “beque” (do inglês back), e ainda “ponta-direita”, “centroavante”, “ponta-esquerda”, “alfos” (half), esse era o meio de campo. Você parece um “dorado”. Eram pessoas claras e aloiradas, geralmente andavam quase em fila indiana pelas ruas da cidade. Gostavam demais de rosca e a origem predominante era a região de Dourados e no então bairro Vila Constantino. Há versões que seus antepassados vieram da Europa (talvez, Hungria).
DIALETOS COMERCIAIS... – Na padaria encontrava-se “pão de sal”, “pão doce”, “pão sovado” e “rosca”. Mulher não entrava em bar... radiola tocava long-play (LP), compacto e 78 rotações (discos populares de vinil com duas músicas), e, sintonizava emissoras em ondas médias (AM) e curtas (nem havia o FM). “Guarda-livros” era o atual contador. E a escola de contabilidade era chamada de “Escola Técnico de Comércio”. Calça jeans era calça “Far-west”. Taxista chamava-se “chofer de praça”, rapaz bonito era um “pão” e moça bonita uma “uva”. “Mascate” era o vendedor ambulante, que ia de casa em casa, com a sua mala, vendendo roupas e colchas. Mulher não usava calça comprida, mas quando começou a usá-la, no final dos anos 60, a calça era denominada “eslaque” (slack). “Casimira”, “linho”, “brim”, “tergal”, “seda” e outros termos no comércio de roupas. “Tempo de dentista prático” (sem formação acadêmica), como Modesto Teixeira e “rábula” (advogado sem ter ido à escola), como Benedito Caldeira.
ESSA ÉPOCA EXISTIU – Nos anos dourados era assim. Anos 50, 60 e parte de 70. Nos dias atuais tudo isso é tão somente mais um agradável retrato na parede. Vale recordar. E curtir.
(Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.)
Dos 34 municípios que formam a Região Intermediária de Patos de Minas, incluindo Paracatu, Unaí, São Gotardo e redondezas, Patrocínio tem 100% de cobertura de água