
Profissionais da educação participaram em peso da audiência na ALMG, em 10 de julho, para debater o projeto de militarização. Foto: Willian Dias / ALMG
Da Redação da Rede Hoje
A proposta do Governo de Minas de ampliar o Programa das Escolas Cívico-Militares de nove para cerca de 720 instituições estaduais gerou reações imediatas e intensas durante audiência pública realizada nesta quinta-feira (10/07) na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). O encontro, promovido pela Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia, escancarou o embate entre governo, sindicatos e parlamentares sobre o futuro da educação pública no estado.
O plano prevê que comunidades escolares decidam, por votação não secreta, sobre a adesão ao modelo. O processo deve ocorrer até 18 de julho, segundo memorando da Secretaria de Estado de Educação (SEE), que estipulou o prazo de 15 dias para a consulta.
Críticas à legalidade e à forma da consulta
Parlamentares e entidades da educação criticaram a ausência de base legal estadual para a implementação do programa e a celeridade da votação. A deputada Beatriz Cerqueira (PT), que preside a comissão, lembrou que um projeto semelhante já foi rejeitado pela ALMG. “Não cabe ao Estado criar diretrizes educacionais que são de competência da União”, afirmou.
O modelo prevê atuação de militares da reserva em funções de apoio à gestão, disciplina e atividades cívicas, sem ministrar aulas. A subsecretária de Desenvolvimento da Educação Básica, Kellen Senra, garantiu que os currículos não serão alterados e que a adesão às práticas cívico-militares será definida por cada escola.
Sindicatos veem risco de uso eleitoral
Para o Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE/MG), a forma como a votação será realizada — com identificação dos votantes — pode gerar retaliações e fragiliza a legitimidade da consulta. O coordenador jurídico do sindicato, Luiz Fernando Oliveira, apontou que grande parte das escolas convocadas está situada nos maiores colégios eleitorais do estado, o que levantaria suspeitas sobre a intenção do governo.
A crítica foi reforçada por especialistas presentes. A psicóloga Fabyolla de Castro e a pesquisadora Catarina Santos alertaram que o programa ignora políticas de mediação de conflitos previstas em lei e reforça um ambiente de medo, ao invés de investir em psicólogos e assistentes sociais.
Valéria Morato, presidenta do Sindicato dos Professores de Minas Gerais, questionou a qualificação dos militares da reserva. “Por que não contratar profissionais da educação com formação adequada?”, indagou.
Governo defende modelo como resposta à insegurança nas escolas
O secretário de Educação, Igor de Alvarenga, afirmou que a proposta busca oferecer mais segurança no ambiente escolar. Segundo ele, os opositores ao modelo têm uma postura antidemocrática ao tentar barrar judicialmente a consulta. “A proposta respeita a gestão pedagógica e garante apoio disciplinar sem interferência no ensino”, disse.
Parlamentares divididos
Deputados da base do governo defenderam o modelo. Lincoln Drumond (PL), Bruno Engler (PL) e Coronel Henrique (PL) alegaram que o modelo tem boa aceitação da população e melhora os indicadores educacionais. Já parlamentares da oposição, como Lohanna (PV) e Betão (PT), criticaram o custo mais elevado do sistema e o uso ideológico da proposta.
A deputada Ana Paula Siqueira (Rede) alertou para o impacto orçamentário do modelo, que pode ser até três vezes mais caro do que o ensino convencional. O deputado federal Rogério Correia (PT-MG) informou que o tema já é alvo de ações no Supremo Tribunal Federal (STF), que analisará a constitucionalidade da criação de modelos escolares distintos dentro da mesma rede pública.
Consulta em Patrocínio e Alto Paranaíba
Três escolas estaduais de Patrocínio — José Eduardo Aquino (Morada Nova), Irmã Gislene (São Cristóvão) e Dom Lustosa (São Vicente) — aprovaram em assembleias a adesão ao Programa das Escolas Cívico-Militares, com maioria dos votos favoráveis entre pais, alunos e servidores. A última consulta acontecerá na Escola Estadual Professora Ormy Araújo Amaral (Nações), cuja assembleia está marcada para o dia 14 de julho.
Após as assembleias, as quatro unidades têm até 18 de julho para formalizar o aceite ao programa, conforme orientação da Secretaria de Estado de Educação. A inclusão definitiva dependerá de critérios técnicos, como a disponibilidade de efetivo militar. O modelo prevê gestão compartilhada com a Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros, sem mudanças no currículo, mas com foco em disciplina, respeito e cooperação.
Outras cidades da região também estão envolvidas: Patos de Minas, com oito escolas; e Araxá, com seis. A consulta local segue o mesmo modelo adotado em todo o estado, com votação aberta envolvendo pais, responsáveis, alunos maiores de 16 anos e servidores.
Escolas cívico-militares: o que muda
Diferente dos colégios militares convencionais, as escolas cívico-militares são geridas pela rede civil de ensino. Militares da reserva atuam em funções de apoio disciplinar e organização, mas não interferem no conteúdo pedagógico. A proposta é apresentada como uma parceria entre a Secretaria de Educação e corporações militares, como a Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros.
Com o prazo da votação se encerrando em 18 de julho, a discussão sobre o modelo deve continuar movimentando escolas, famílias, sindicatos e o cenário político em Minas Gerais.