
A Comissão de Direitos Humanos debateu a possibilidade de uso dos imóveis a serem transferidos à União no âmbito do Propag para moradia e regularização fundiária. Foto: Willian Dias
Da Redação da Rede Hoje
A inclusão de imóveis com reconhecida função social na lista de ativos estaduais que poderão ser repassados ao governo federal como forma de amortizar a dívida de Minas Gerais com a União provocou forte reação durante audiência pública realizada na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) nesta quarta-feira (9/7). O debate foi promovido pela Comissão de Direitos Humanos da Casa e contou com a participação de lideranças de movimentos sociais, representantes de comunidades tradicionais e autoridades estaduais.
A proposta está prevista no Projeto de Lei (PL) 3.733/25, de autoria do governador Romeu Zema, que autoriza a federalização de imóveis do Estado como parte do Programa de Pleno Pagamento das Dívidas dos Estados (Propag). Caso os imóveis não sejam aceitos pela União, poderão ser vendidos, com desconto de até 45%, para abatimento da dívida.
Durante a audiência, movimentos sociais exigiram a retirada de imóveis com função social da lista prevista no projeto. Um dos principais alvos da crítica foi a Casa de Referência da Mulher Tina Martins, localizada na Savassi, em Belo Horizonte. O espaço, ocupado por movimentos sociais desde 2016, oferece acolhimento a mulheres vítimas de violência com apoio de assistentes sociais, psicólogos e advogados voluntários. Mais de 10 mil mulheres já passaram pela casa.
A assistente social Paolla Dias Barbosa Fonseca Izidio disse que a equipe foi surpreendida com a informação de que o imóvel foi incluído na lista do Propag. “Sem esse imóvel, a casa não pode fazer seus acolhimentos”, afirmou. Ela também criticou a falta de diálogo com o governo estadual.
Outro caso citado foi o prédio que abrigou o antigo Departamento de Ordem Política e Social (Dops), onde hoje funciona o Memorial de Direitos Humanos Casa da Liberdade. O local, ocupado desde abril, tem recebido visitas educativas com o objetivo de preservar a memória da repressão na ditadura militar. Renato Campos Amaral, coordenador do movimento Luta de Classes, disse que já tentou acordo com o Estado em quatro reuniões, sem sucesso. “Nós estamos lá e resistiremos”, disse.
A deputada Bella Gonçalves (Psol), presidenta da Comissão de Direitos Humanos, afirmou que o projeto inclui ainda imóveis como comarcas do interior, unidades da Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg), o Palácio das Artes, o Hospital Risoleta Neves e a Escola Estadual Milton Campos. Para ela, os ativos com função social deveriam ser excluídos da negociação. “Esses espaços deveriam ser destinados à reforma agrária, moradia popular e regularização fundiária”, defendeu.
A deputada Andréia de Jesus (PT) reforçou as críticas e mencionou o uso potencial dos imóveis para programas como o Minha Casa Minha Vida ou para comunidades quilombolas.
Por outro lado, o subsecretário de Estado de Gestão de Imóveis, Eduardo Quintanilha de Albuquerque, defendeu o projeto como uma oportunidade para resolver entraves antigos. Ele afirmou que o Estado tem áreas ociosas e que repassá-las ao governo federal, via Incra, poderia acelerar a regularização fundiária em Minas Gerais. “Estamos aqui para escutar e abertos a rever situações pontuais”, disse.
O Projeto de Lei 3.733/25 ainda tramita na ALMG e deverá passar por novas discussões antes de ser votado em plenário. Movimentos sociais já sinalizaram que continuarão pressionando pela exclusão de imóveis considerados essenciais para a garantia de direitos básicos.