Projeto promete soluções sustentáveis para o lixo, mas vereadores divergem sobre tempo de discussão e risco de privatização, portanto o Governo Municipal perderia o controle sobre o serviço
Adesão ao Cispar prevê o envio do lixo de Patrocínio (hoje depositado no lixão da foto) para usina de triagem em Patos de Minas, como parte do programa Lixão Zero. Foto: arquivo Rede Hoje
Da Redação da Rede Hoje
Na noite desta terça-feira (3), a Câmara Municipal de Patrocínio aprovou, em regime de urgência, por 7 votos a 2, a adesão do município ao Consórcio Público Intermunicipal de Desenvolvimento Sustentável do Alto Paranaíba (Cispar). A decisão é considerada um passo importante para a gestão integrada e sustentável dos resíduos sólidos na região, mas também acendeu questionamentos sobre a rapidez da tramitação e os riscos envolvidos no modelo de concessão.
O presidente da Câmara, Níkolas Elias, defendeu a proposta como uma solução inovadora e economicamente vantajosa. Segundo ele, o consórcio permitirá transformar chorume em adubo e o gás em energia elétrica, além de extinguir os lixões a céu aberto e gerar receita para os municípios. “É um avanço necessário para adequar Patrocínio às exigências da Política Nacional de Resíduos Sólidos”, reforçou.Níkolas Elias, presidente da Câmara
De fato, o consórcio é visto como a saída para resolver problemas históricos da cidade e da região, como a falta de estrutura para coleta seletiva e a presença de lixões. O Cispar, que reúne outras 18 cidades, implementará o programa Lixão Zero, com uma usina de triagem em Patos de Minas para atender nove municípios.
O que diz o CISPAR
Em documento obtido pela Rede Hoje junto ao Consórcio Público Intermunicipal de Desenvolvimento Sustentável do Alto Paranaíba (CISPAR), o Plano Intermunicipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (PIGIRS) é apresentado como um instrumento fundamental de planejamento que organiza, de forma conjunta e sistemática, a gestão dos resíduos sólidos entre os municípios consorciados. Esse plano visa subsidiar decisões compartilhadas, alinhando-se à Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/2010), à Política Nacional de Saneamento Básico (Lei nº 11.445/2007) e à sua atualização (Lei nº 14.026/2020). A proposta busca assegurar a atuação conjunta entre os municípios e demais agentes, como concessionárias, fabricantes, distribuidores e comerciantes, dentro da lógica da responsabilidade compartilhada, prevista em lei.
Ainda conforme o documento analisado, o PIGIRS estabelece a gestão integrada de resíduos sólidos como um processo que considera dimensões políticas, econômicas, ambientais, culturais e sociais, com participação popular e foco no desenvolvimento sustentável. O plano incorporou os diagnósticos e estratégias dos planos municipais sem prejudicar as políticas locais, definindo as principais áreas da gestão de resíduos e a responsabilidade de cada ator. Assim, a execução das etapas operacionais de manejo caberá à futura concessionária e aos municípios, enquanto a logística reversa será tarefa do setor privado, cabendo ao poder público a articulação e fiscalização. Diz o documento que o objetivo final do PIGIRS, segundo o CISPAR, é fomentar soluções comuns e eficientes para todos os municípios integrantes do consórcio.
Privatização?Paulinho Peúca, vereador
Entretanto, a rapidez do processo — aprovado em regime de urgência — gerou críticas. O vereador Paulinho Peúca votou contra e questionou a falta de uma audiência pública sobre o tema. “Estamos terceirizando um serviço essencial sem ouvir a população. O debate sobre o aterro sanitário se arrasta há décadas. Por que agora essa pressa?”, indagou.
Peúca também alertou para o risco de privatização da coleta de lixo, apontando que a execução será feita por uma futura concessionária. “Depois que aprovamos, a tarifa será definida e revisada pela prestadora. Isso é, sim, uma privatização do serviço”, disse. Na realidade, na privatização de serviços públicos os governos passariam a não ter o controle sobre aquela atividade — inclusive nos valores de taxas —, mesmo com o regramento.
Governo Municipal diz que não
Em resposta, o líder do governo, vereador Humberto Donizete Ferreira (Bebé), negou que a adesão ao consórcio represente uma privatização. Segundo ele, o serviço continuará sendo público, com fiscalização municipal. “Assim como o Daepa é responsável pela água, a gestão dos resíduos seguirá sob responsabilidade do município. O modelo do consórcio é uma parceria entre cidades para buscar soluções sustentáveis e mais baratas, não uma entrega à iniciativa privada”, afirmou.Humberto Donizete Ferreira (Bebé), vereador
Bebé também destacou a urgência do tema ambiental e o risco de esgotamento do atual lixão da cidade. “A legislação federal exige o fim dos lixões. Não temos outro lugar para descartar o lixo. O consórcio é a melhor solução”, garantiu.
Fatura na conta do Daepa
Outro ponto sensível foi a futura cobrança pela execução do serviço, estimada entre R$ 20 e R$ 30 mensais, a ser incluída na conta do Departamento de Água e Esgoto de Patrocínio (Daepa). A data para o início da cobrança ainda não foi definida. Famílias inscritas no CadÚnico, moradores da zona rural e isentos de IPTU estarão livres da tarifa.Marquinhos Remis, vereador
Para o vereador Marquinhos Remis, que votou favoravelmente, não há como fugir da taxa: “Se não cobrarmos, pode ser caracterizado como renúncia fiscal. O importante é que o lixo seja tratado com responsabilidade e o meio ambiente preservado”.
A adesão de Patrocínio ao Cispar representa um avanço na modernização da política de resíduos sólidos, mas o debate em torno da velocidade da aprovação e da transparência do processo mostrou que a busca por soluções sustentáveis também exige um diálogo mais amplo com a sociedade.