Muito se tem falado na imprensa sobre intenções do Presidente da República de se afastar das instituições republicanas, como o Judiciário e o Legislativo, fundamentais em uma democracia.

Quem conhece um pouco da História do Brasil, não deixa de notar a semelhança do momento político atual com a época de 64. Naquela época, inicialmente houve um golpe cívico-militar. Posteriormente, os militares alijaram da politica todos os civis- Juscelino e Lacerda, por exemplo, e houve um golpe dentro do golpe e os militares governaram sozinhos por vinte anos.

Tomando com base os fatos ocorridos em Minas Gerais, que teve papel preponderante em 64, são muitas as semelhanças entre os dois momentos e enumerá-las tornam óbvias as intenções do atual governo. Naquela época, prevendo que o país caminhava para o regime comunista, temerosos de aqui acontecer o que havia acontecido em Cuba, uma das preocupações da direita daquela época foi armar os fazendeiros contrários à reforma agrária que seria proposta por João Goulart. Em Minas, na região de Corinto e Diamantina, bispado de Dom Sigaud, radicalmente direitista, os fazendeiros recebiam armas até pelo correio. Bolsonaro pretende que cada cidadão possa ter até quatro armas.

O golpe de 64 foi preparado com uma grande mobilização das polícias militares, principalmente em Minas Gerais, onde o Coronel José Geraldo, comandante da PM mineira, aderiu totalmente ao movimento. Bolsonaro tenta cooptar as polícias militares e inclusive pretendia gastar dezessete milhões de reais na compra de fuzis para equipar não somente o exército o que é natural, mas também as polícias militares. Em um momento em que se procura privatizar as ferrovias, a extinta polícia ferroviária vai ser recriada, dando ainda mais poder ao governo federal junto às polícias.

Jango não era comunista, era latifundiário no Rio Grande do Sul. Fez um governo dúbio e mostrou-se leniente com as greves, com as manifestações pelas reformas de base que incluíam a reforma agrária temida por todo os proprietários de terra, acirrando ainda mais o ânimo da direita. Governou dentro de total instabilidade política. O governo atual procura de toda forma desestabilizar a política, com manifestações claras contra as instituições, contra o STF e contra o congresso nacional . Desestabilizando as instituições, aumenta a força do governo central. Em Minas, no período que antecedeu o golpe, Augusto de Lima, neto, um civil, conclamou abertamente a polícia militar, com folhetos distribuídos em Belo-Horizonte, na cidade inteira, a se rebelar e não atender o governador Magalhães Pinto para dar cobertura a um congresso de trabalhadores previsto para ser realizado em Belo-Horizonte.

O governo Bolsonaro propôs esta semana que os crimes de ofensa às forças armadas sejam julgados por um tribunal militar. Todos os que aderiram à luta armada entre 1968 e 1978 , os terroristas, foram julgados por um tribunal militar. Jango anistiou todos os marinheiros participantes da revolta dos marinheiros, que tinha entre seus líderes o cabo Anselmo, o que acirrou ainda mais o ânimo da cúpula militar contra seu governo. Bolsonaro não permitiu a punição ao ex-ministro Pazuelo, um militar de alta patentes, informalmente o anistiou. O movimento de 64 teve uma ampla adesão da sociedade, dos civis, inclusive da Igreja Católica que, posteriormente, diante das torturas, tornou-se ferrenha combatente da ditadura. Bolsonaro busca uma ampla adesão de sociedade ao seu governo e a maior expressão são os passeios de moto, as motociatas. Hoje tem a seus favor não a Igreja Católica , mas as igrejas evangélicas.

A revolução de 64 teve amplo apoio das grandes empresas, das multinacionais que financiaram não só o golpe, como também, mais tarde, a tortura. A Volks permitiu, naquela época, a prisão e o interrogatório de funcionários dentro da própria fábrica. Bolsonaro, em seus desvarios conta, com o apoio de grandes empresários, explicitamente, dos donos da Havan e da Wizard. O governo militar suspendeu as eleições previstas para 1966. O governo atual já deixou claro, se depender dele e não mudarem as urnas, não haverá eleições em 2022.

Além disto, a CIA deu todo o apoio e suporte ao movimento de 64. Não é de estranhar a recente visita de elemento da CIA ao Brasil, certamente preocupados com a América Latina, com as eleições no Peru e no Chile e com a polarização direita/ esquerda no Brasil após a volta de Lula ao cenário político.

A imprensa tem falado quase diariamente em intenções golpistas do presidente Bolsonaro. As semelhanças do atual governo com o golpe de 64 são inúmeras. E os militares já estão no governo. Por vias democráticas, mas estão. Só falta realmente o golpe tão almejado por Bolsonaro.

Waldete Caldeira Nunes, 99 anos


Testemunha.
A histórica é de suma importância. E quando se trata de uma longeva patrocinense falando de Patrocínio é mais fascinante ainda. Lúcida, alegre, de bem com a vida, é essa testemunha antológica, que completou 99 anos dia 23 de junho. Waldete Caldeira Nunes é o seu nome. Ou simplesmente Dona Waldete.

UM POUCO DE D. WALDETE – Há cinquenta anos, reside em Belo Horizonte, próximo à Assembleia Legislativa. Portanto por quase 50 anos viveu em Patrocínio. Nasceu no bairro São Vicente, Rua São João, próximo à Santa Casa, em 23/6/1922. Os seus pais são José Caldeira Machado e Januária Moreira Caldeira, que foi casada por duas vezes.

A FAMÍLIA – Em 15/5/1943, casou-se com Aristóteles Afonso Nunes, antigo gerente do Banco Mineiro da Produção (depois Bemge). O padre holandês Williboro, sacerdote paroquial, foi o celebrante do casamento (esse sacerdote foi sepultado na Igreja Matriz, em frente a um dos altares laterais). D. Waldete tem três filhos e uma filha adotiva, oito netos, nove bisnetos e um trineto. Ou seja, um de seus bisnetos já tem filho, que se chama Matheus. Isso é caso muito raro na família brasileira.

MANIAS QUE PERDURAM – Adora a comida mineira, principalmente o tradicional feijão com arroz e carne. D. Waldete ama receber amigos e familiares em sua casa. Católica praticante, não deixa de orar diariamente. Adora o baralho, em jogos com a família e amigos. No esporte, gosta de voleibol. Em Patrocínio, final dos anos 30 e anos 40, tornou-se uma das primeiras e melhores atletas de voley na cidade.

DONA WALDETE ASSISTIU A UM MILAGRE DE PE. EUSTÁQUIO – Novembro de 1941. Hora do término das aulas na Escola Normal Nossa Senhora do Patrocínio (hoje, Belaar). Uma multidão se encontra na porta da igreja. Padre Eustáquio abençoa os fiéis, sejam pobres ou ricos, negros ou brancos. As alunas, de uniforme, mais curiosas, correm em direção à Matriz. Uma dessas alunas é Waldete Caldeira, de família patrocinense, hoje com 99 anos, residente em BH. Outra aluna, que acompanha Waldete, é Suzana Carvalho (falecida). Nesse momento, se aproxima um automóvel preto (carro era só importado, Ford ou Chevrolet). No banco traseiro, há uma senhora deitada.

A CURA DE PADRE EUSTÁQUIO – Segundo Dona Waldete, o motorista, Sr. Euclides, desce do carro e se dirige ao sacerdote:
Padre, peço-lhe bênção para a minha esposa Ambrosina, que há anos não anda mais.
Dando alguns passos rumo ao veículo, Padre Eustáquio abre a porta traseira, olha para a mulher e diz:
Você tem fé? Você é católica?
Após a resposta positiva da paralítica, o santo padre pede para Ambrosina fechar os olhos. E ele olhou para o céu e orou, por alguns instantes. A multidão, e nela se encontra Waldete Caldeira, em total silêncio, acompanha a cena de fé e esperança. Em seguida, Padre Eustáquio abaixa um pouco a cabeça, e diz:
Ambrosina, abra os olhos, pois agora te darei a bênção. Receba com muita fé.
Por três vezes, ele repete a bênção. Depois, diz:
Filha, desça do automóvel. Venha...
Não posso, não dou conta, Padre,... responde Ambrosina.
Você diz que tem fé. Então, venha...
Ela remexe no banco do carro, assenta-se com dificuldade, levanta o corpo vagarosamente, põe os pés no chão e, cambaleando, começa a andar em direção ao sacerdote holandês, que pede para ela dar uma volta em torno do automóvel. A multidão atônita se curva e reza. O inacreditável acontece. E depois, a Sra. Ambrosina andou por toda a sua vida, segundo dona Waldete (Ambrosina era parente da família Caldeira).

HISTÓRIAS DE DONA WALDETE, CONTADA NESSA SEMANA – No final dos anos 30, Waldete foi contratada para trabalhar como “vagalume” (tipo “lanterninha”) no cinema do Largo do Rosário (Praça Honorato Borges). Um médico de BH, no cinema, encantou com ela e solicitou à sua mãe Januária para ela (Waldete) trabalhar em seu consultório. Pedido negado. Nos anos 40, nos bailes do Clube Itamarati (Edifício Rosário), Waldete e seu marido Aristóteles ganharam o 1º lugar nas fantasias, casal mais animado, e dança, no carnaval.




Dona Waldete com o filho José Eustáquio Cladeira "Taquinho"

OS MELHORES DE ENTÃO... –
Essa maravilhosa patrocinense, que desafia o tempo, considera Enéas Aguiar (UDN), o melhor prefeito de Patrocínio (1959-1962). Além de Padre Eustáquio, Padre Mathias (primeiro diretor do Ginásio Dom Lustosa e vigário em 1931/33), foi o padre de maior importância para a cidade. Da mesma forma, Irmã Gislene (diretora da Escola Normal, anos 30 e 40) e Irmã Maximiliana (permaneceu na Santa Casa por quase 40 anos a partir de 1939) foram as freiras mais relevantes na vida de Patrocínio (todo o seu histórico depoimento, de 1º/07/2021, encontra-se gravado com este autor).


 

Emprego
. Muito se fala sobre ele. Em Patrocínio não é diferente. Como uma amostra, um bom indicador, o Sebrae/MG demonstra o emprego ou desemprego gerado pelas Micro e Pequenas Empresas, as conhecidas MPE. Isso em 2021, de janeiro a abril, acumulado. Os dados são do Cadastro Geral de Empegados e Desempregados, o Caged, do Ministério do Trabalho e Emprego. No contexto mineiro, os setores da indústria e de serviços tiveram melhores desempenhos em 2021. Na região Noroeste e Alto Paranaíba, juntas, Patrocínio ocupa tão somente o 7º lugar no aumento de número de empregos gerados por MPE para todos os setores. Por incrível que pareça, o setor da indústria é o de melhor performance patrocinense: 4º lugar regional.


Padre Eustáquio em 1943


Epopeia
. Fatos memoráveis e gloriosos sempre marcam um tempo. Há quinze anos, carismático e milagroso sacerdote holandês foi beatificado no Brasil. Exatamente na tarde e noite de 15 de junho de 2006. E uma emissora de rádio fez uma singular transmissão da beatificação. Talvez, nenhum componente da mídia (rádio, TV ou jornal) tenha feito ação semelhante até à época. Padre Eustáquio e Rádio Difusora são os épicos protagonistas do inesquecível acontecimento.

A BEATIFICAÇÃO – Quinta-feira, dia 15/6/2006, Estádio Mineirão com mais de 70 mil fiéis, 16h, aconteceu a solenidade. Embora por volta de 13h a área externa do antigo Mineirão já cotinha “um mar” de gente. O arcebispo Dom Walmor Oliveira de Azevedo (hoje, presidente da CNBB) dirigiu o evento juntamente com o representante do Vaticano.

PRESENÇA PATROCINENSE – Em torno de 300 devotos do Padre Eustáquio de Patrocínio estiveram no Mineirão, liderados pelo padre Vinicius Maciel (hoje, pró-reitor do Santuário/Igreja de Padre Eustáquio em BH) e pelo padre Osmânio.

O QUE É BEATIFICAÇÃO – É um ato oficial da Igreja, onde o Papa inscreve um cristão como bem-aventurado. Isso após comprovação de um milagre atribuído ao cristão. Em poucas palavras, é o passo mais importante no caminho para esse cristão se tornar santo, no futuro.

Padre Eustáquio(em pe), Padre Matias(primeiro diretor do Ginásio Dom Lustosa) e Padre Gil, em 1925. Pouco depois estiveram em Patrocínio.


QUEM FOI PADRE EUSTÁQUIO
– Nasceu em Aarle-Rixtel, Holanda, no dia 3/11/1890. Em 12/6/1925 chegou ao Rio de Janeiro e em 15/6/1925 à Água Suja (Romaria), onde foi nomeado vigário. Em 11/9/1926, em uma de suas visitas a Patrocínio, Padre Eustáquio van Lieshout, em nome da Congregação dos Sagrados Corações assinou o contrato de doação do imóvel para instalação do Ginásio Dom Lustosa. Em 15/2/1936 foi transferido para Poá, pertinho de São Paulo, onde apareceu nacionalmente devido aos seus milagres. Em 11/10/1941, após rápidas passagens por Rio Claro, Campos do Jordão, Araguari e Rio de Janeiro, chegou a Patrocínio, onde se tornou capelão da (pequena) Igreja de Santa Luzia e padre na Santa Casa, mas residindo no Ginásio. E diversos milagres aconteceram na cidade pelas suas bênçãos. Em 12/2/1942, foi transferido para Ibiá, viajando de trem. Em 7/4/1942, ocorreu a sua chegada em BH, onde assumiu a direção da Paróquia de São Domingos. Em 30/8/1943, faleceu no Hospital Alberto Cavalcanti (BH). Nesse um ano e quatro meses, realizou diversos milagres (a ele atribuídos). Em 31/8/1943, a capital assistiu ao seu mais solene féretro (enterro). Autoridades e uma multidão participaram do sepultamento. Os seus restos mortais, hoje, estão sepultados na Igreja que leva o seu nome, na rua e bairro que têm o seu nome também.

SUI GENERIS – A Rádio Difusora foi uma das três emissoras presentes no Estádio (Rádio América/BH e Rede Católica de Rádio), transmitindo em tempo real. A, então, Difusora-AM e pela Internet começou a sua jornada cristã às 14h e encerrou às 21h30min, algum tempo após o término da solenidade. Antes e depois do evento da beatificação no gramado do Mineirão, foram apresentadas diversas passagens do santo padre em Patrocínio e Romaria. Participaram da mais histórica jornada da rádio, segundo Sanarelli, os repórteres Cristiano Romão e o (próprio) Alberto Sanarelli, percorrendo o hall e todos os espaços estratégicos do Estádio. E, na cabine nº 1, este cronista (Eustáquio Amaral) e José Maria Campos, que dia 15 desta semana disse: “...hoje faz 15 anos exatos que realizamos a mais longeva transmissão da história da Rádio Difusora Foram sete horas e meia ininterruptas...” Além dos quatro apresentadores, Benildo Borges cuidou da logística e técnica da Difusora.



1941: Multidão em frente à, então, Capela de Santa Luiza, em Patrocínio, em uma das primeiras bençãos de Padre Eustáquio na cidade


E MAIS...
– Nessas sete horas e meia, não houve intervalos, nem interrupções, apenas eram lidas mensagens de seis patrocinadores da transmissão. Grupo AGAL (combustíveis), Casas Manoel Nunes, Colégio Atenas, Viação Cidade de Patrocínio, Reunidas Agropecuária e Paróquia Padre Damião de Molokai. Tudo o que foi dito envolvia a vida de Padre Eustáquio.




Fotos:
1. jornalistas credenciados Cristiano Romão, Benildo Borges e Alberto Sanarelli no gramado do Mineirão, durante a Baetificação em 2006
2. Arcebisbo Dom Walmor na leitura ritual à vista do Mineirão lotado

3 . José Maria Campos e Eustáquio Amaral, às 21h, comentando a beatifiação na cabine central do estádio.


FONTES DAS FOTOS
– Livro Bem-Aventurado Eustáquio, escrito pela patrocinense Lucélia Borges Pereira. Arquivo do Patrocínioonline e livro de José Vicente Andrade.

ERRAMOS – Na edição passada, crônica sobre o craque Peroba, a foto que aparece no tópico “Cena Um: 1950” refere-se ao episódio apresentado na “Cena Dois: 1952”. E vice-versa. As demais fotos estão com as legendas corretas. Pedimos desculpas.

(Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.)