Dois cafeicultores associados à Cooxupé flagrados submetendo 11 trabalhadores a condições de trabalho análogas à escravidão

Alojamento precário em que foram resgatados 11 trabalhadores em condições análogas à escravidão em fazenda de café em Minas Gerais - Gerência Regional do Trabalho de Poços de Caldas

Redação da Rede Hoje

Dois produtores de café recentemente adicionados à “lista suja” do trabalho escravo pelo governo federal, em sua mais recente atualização divulgada em 5 de abril, são fornecedores da Cooxupé (Cooperativa Regional dos Cafeicultores de Guaxupé), reconhecida como a maior cooperativa de café do mundo. A Cooxupé, responsável por 10% das exportações brasileiras desse grão, tem como cooperados Jurandir Marques Bueno, vinculado desde 1989, e seu sobrinho, Rafael de Lima Bueno, que aderiu em 2006. A reportagem foi publicada no portal Brasil de Fato, Leia a nota completa aqui.

No ano passado, em julho, fiscais do Trabalho descobriram 11 trabalhadores submetidos a condições análogas à escravidão no Sítio Douradinha, situado em São Pedro da União (MG), propriedade que é dividida entre Jurandir Marques Bueno e seu sobrinho Rafael de Lima Bueno. O café produzido por Lima Bueno na última safra, após sua entrega à Cooxupé, estava destinado a mercados globais, pois o produtor detinha a certificação 4C (Código Comum para a Comunidade Cafeeira), uma das principais certificações por boas práticas do setor.

Trabalhadores são resgatados em condições análogas à escravidão em fazenda em Minas Gerais / Gerência Regional do Trabalho de Poços de Caldas

A jornalista Poliana Dallabri da Repórter Brasil, apurou que a 4C informou que Rafael de Lima Bueno já foi certificado, mas sua certificação não está mais ativa, sem especificar quando ele perdeu o selo. Os trabalhadores resgatados estavam alojados em condições precárias, em um espaço com dez dormitórios com paredes mofadas, onde, durante o pico da safra, até 22 pessoas eram acomodadas. Eles se alimentavam nos dormitórios, sem uma cozinha adequada, e compartilhavam o espaço com diversos itens inflamáveis, incluindo combustível para as máquinas de colheita de café.

A Cooxupé, ao ser contatada, não comentou sobre os cooperados listados no trabalho escravo, afirmando apenas que não comercializa café de propriedades que não seguem a legislação trabalhista e suspende as atividades comerciais em caso de inclusão na lista de inconformidades. Rafael de Lima Bueno não respondeu aos questionamentos, enquanto Jurandir Bueno não foi localizado.

Além disso, durante a fiscalização, foi constatado que sete dos 11 trabalhadores resgatados na propriedade de Rafael Bueno também haviam trabalhado na colheita de café de Jurandir Bueno, levando à autuação de ambos. Os trabalhadores foram contratados por um intermediário de mão-de-obra, conhecido como “gato”, que os trouxe de Varzelândia, na região norte de Minas Gerais. Desde o trajeto até a fazenda, irregularidades foram identificadas: os trabalhadores não tinham registro em carteira e precisavam pagar suas próprias passagens de ônibus.

Jurandir Bueno também cobrava pelo alojamento dos funcionários, descontando o valor do pagamento deles. Outros descontos ilegais nos salários foram descobertos, incluindo o custo da gasolina utilizada nas máquinas de colheita. Na fazenda, não havia banheiro químico, água nas frentes de trabalho ou Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) fornecidos.

A Cooxupé ficou na 26ª posição na lista da Forbes das 100 maiores empresas do agronegócio brasileiro de 2023, é a única cooperativa exclusivamente de café a integrar o seleto grupo da revista. Na última safra, a cooperativa faturou R$ 6,4 bilhões, exportando café para 50 países. Apesar disso, denúncias de trabalho escravo em fazendas de seus cooperados são recorrentes.

A organização Adere/MG, que monitora as condições de trabalho no campo, expressa descontentamento com a falta de ação da Cooxupé diante dessas questões. A cooperativa, por sua vez, afirma que trabalha para promover boas práticas junto aos cooperados e que realiza diversos eventos e atividades para esse fim.

Repórter Brasil mostrou em fevereiro que o número atual de auditores fiscais – cerca de 1.900 – é o menor em três décadas. À época, mais de 300 servidores entregaram cargos de chefia em uma reivindicação para o cumprimento de um acordo feito em 2016 pela então presidente Dilma Rousseff (PT) sobre bônus de eficiência e investimentos em infraestrutura.

Trabalhadores dormiam em cômodo com alto risco de incêndio. Camas dividiam espaço com fogão e outros materiais inflamáveis / Gerência Regional do Trabalho de Poços de Caldas

A primeira denúncia sobre as condições de trabalho no Sítio Douradinha foi recebida em 2021, mas a falta de servidores para fiscalização impediu a averiguação até a última safra. A escassez de auditores fiscais é evidente, com o atual número sendo o menor em três décadas. 

Repórter Brasil entrou em contato com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) para questionar os planos da pasta para recomposição do número de auditores, mas não obteve retorno até o fechamento desta reportagem. A última atualização do cadastro de empregadores que submeteram trabalhadores a condições análogas à escravidão, popularmente conhecido como “lista suja” do trabalho escravo, incluiu 27 cafeicultores. Entre os casos em geral, foram 248 novos patrões, número recorde, chegando a 654 responsabilizados. Trabalho doméstico e pecuária lideram os recém-chegados.


Fonte: Brasil de Fato. Esta reportagem é baseada na matéria título: “Produtores da maior exportadora de café do Brasil entram na ‘lista suja’ do trabalho escravo”, assinada pela repórter Poliana Dallabrida Repórter Brasil, que pode ser lida aqui.


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